terça-feira, julho 06, 2004

O intuito disso aqui eu não sei muito bem, ainda, qual é... Agora que algumas pessoas já tomaram conhecimento da existência desse espaço, sinto-me cada vez mais acanhado pra escrever aqui, não só pelo que possa exprimir, como também pela forma como as idéias são expostas. É tolice, no entanto, supor que tal preocupação surta algum resultado que não o fim prematuro de algo que, no final das contas, não significa muito, senão pela possibilidade de articular idéias e sentimentos às vezes tão vagos ou tão persistentes... Esse texto, feito de repente, sem objetivo maior que os imediatos e sem preocupação alguma com a sua qualidade, surgiu na noite do domingo da semana passada, quando ainda estava viajando... Ia deixá-lo quieto, mas se for guardar tudo que escrevo isso aqui não dura...

Ele é, enfim, propositalmente confuso. Espero, no entanto, que seja compreensível o sentimento que o motivou.

Hora zero

Dormir. Aliás, dormir ainda não é possível. Melhor então: trancar-se no quarto para ler, esquecer as sensações nos cômodos, lá fora. Não lembrar das madrugadas silenciosas, repletas de insuspeita angústia, inexplicável insatisfação, nem as horas, todas aquelas que guardaram palavras não-ditas e apenas na mente vividas, remoídas.
Fechar-se para não sentir faltar, uma vez mais, o som da chuva que não se ouve, nem reavivar na memória aquele sorriso que descansa, a tantas casas daqui, mas a poucas ruas ao lado, nem os rostos conhecidos que – quanta saudade! – não me conhecem mais.
Ler. Ocupar a mente para não vê-la regredir, não recordar o triste abandono, a solidão e sua alheia aceitação. Sim, folhear livros para não cair na tentação de ligar a tv e não lembrar, assim, de tantas futilidades que se via enquanto se fazia planos, a própria futilidade tornando-se vida, sentimental apego ao que não se vive.
Deitar-se um pouco, pensar no dia seguinte, no trivial, e cercar-se de questões cotidianas, empurrando para bem fundo de si aquela tristeza passada, aquele lamento nunca confessado, a preocupação transformada em velada vigília, o temor injustificado, talvez, mas ainda assim carregado de urgência.
Não lembrar, simplesmente: das músicas pobres que porventura tocam, dos grilos, das plantas, das árvores enfileiradas nas ruas, até mesmo das próprias ruas e seus horizontes distantes onde se avistam serras, da mesa simples e do café forte... Não, não... Antes da mesa, do café: o latido, o apito do vigia noturno, o silêncio... Cômodos vazios, cada canto da casa comunicando algo, cúmplice de cada momento de abandono por ninguém mais presenciado. E, acima de tudo, o que não se expressa nem se define, puro sentimento físico de presença/ausência.
Esquecer tudo isso... ou então debruçar-se e escrever, a porta cerrada guardando as lembranças lá fora...

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