domingo, abril 24, 2005

Segundo uma amiga minha, Nathalia, as pesquisas mostram que leva cerca de cinco anos até que as pessoas sejam capazes de superar uma grande perda, ou reconstruir plenamente suas vidas após o fim de um grande amor. Para mim, sem dúvida, é uma quantidade de tempo absurda, um prolongar de horas intoleravelmente triste, até que se esqueça, se supere. Sei que não é muito, mas atualmente estou assim, imerso em urgência.
Ainda bem que o amor é uma incógnita, algo que, em sua forma mais completa e intensa, eu até o momento desconheço. Assim, talvez - caso seja estritamente imprescindível - as pequenas coisas que me são preciosas possam ser deixadas de lado, com sorte, em no máximo um ou dois anos, o que, no meu atual estado de espírito imediatista, já é uma vida. O quanto não se pode mudar em um ou dois anos? O quanto se pode deixar para trás e esquecer, em tão pouco tempo?
Espero estar enganado. Espero que, para reconstruir valores, estreitar novos laços, criar novas referências e aprender a não conviver, dois anos passem rápido e sejam mais que suficientes. Porque o que aprecio me é fundamental, e é parte do que justifica cada segundo da minha felicidade escassa, repentina.

sexta-feira, abril 22, 2005

A ninguém caberia a culpa. Unicamente a si mesmo. Oferta enganosa, essa possibilidade de trocar a reclusão pela descontraída aproximação proporcionada pela recusa de qualquer seriedade. Fazer da vida uma brincadeira, de si uma caricatura e dos fatos um impulso em que tudo vale, em que a entrega pouco criteriosa e a imediata satisfação vêm à medida que se subverte a imagem pessoal e o pudor. Humor auto-depreciativo, menosprezo pelo marketing pessoal, pelas personas e imagens sociais cautelosamente zeladas... Isto tudo sendo, também, uma simples persona, como as máscaras teatrais: uma caricatura, simplificada e inegavelmente atraente - inegável atração do divertido, do estereótipo, perfeitamente acomodado na embalagem do divertimento e na promessa de nunca se ofender, mas rir e fazer rir, em seus próprios defeitos e inadequações.
Mas o estereótipo anseia por mais, em uma necessidade por algo incompreensível, indefinível. É nesse ponto, talvez, quando se lembra o quão difícil é a segurança e o conforto do afeto verdadeiro, e quando se questiona o que sustenta o vínculo quando some qualquer graça, quando o mais inibido anseio pelo que é consistente e espontâneo, completo e essencial, emerge. Ou no extremo, quando algo que existe de feio surge - não tudo aquilo que entrete, e sim o feio que incomoda, o feio estética, emocional e socialmente agressivo, incômodo.
Não resta consolo, tampouco identificação. O conforto do vínculo some, as pessoas apenas ao redor. Fica-se assim, nessa breve volta à realidade, ao menos até que haja estômago pra continuar. Estômago, tolerância e humor.
Enquanto isso... lost in solitude.

domingo, abril 17, 2005

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“Toda canção de liberdade vem do cárcere.”
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Sonhei - Lenine

Sonhei e fui, sinais de sim,
Amor sem fim, céu de capim,
E eu olhando a vida olhar pra mim.

Sonhei e fui, mar de cristal,
Sol, água e sal, meu ancestral,
E eu tão singular me vi plural.

Sonhei e fui, num sonho à toa,
Uma leoa, água de Goa,
E eu rogando ao tempo: - Me perdoa
E eu rogando ao tempo: - Me perdoa

Sonhei pra mim, tanta paixão,
De grão em grão, verso e canção,
E eu tentando nunca ouvir em vão.

Sonhei, senti, sol na lagoa
Céu de Lisboa, nuvem que voa,
E um país maior que uma pessoa.

Sonhei e vim, mares de Espanha,
Terras estranhas, lendas tamanhas,
E eu subi sorrindo essa montanha.
E eu subi sorrindo essa montanha.

Sonhei, enfim, e vejo agora,
Beijo de Aurora, ventos lá fora,
E eu cantando a Deus e indo embora.
E eu cantando a Deus e indo embora.

quarta-feira, abril 13, 2005

Silenciosamente


Como se não se pudesse perceber. Quase um fingir, naquele sentimento de que somos ainda próximos – assim como a convivência virando lentamente o consolo da presença futura, o acreditar-se presente, pra tão logo tornar-se o sumiço que só se nota na falta casual de qualquer movimento.
O conhecimento dos fatos vividos, de cada resquício de experiência mentalmente compartilhada, quando vivíamos juntos, mesmo na ausência. O riso era compartilhado, o medo era amparado no apoio, no saber-se ligado, e o choro era sempre contido por uma mão, um olhar, um quieto e mudo estar ao lado, em uma atitude de apenas “ser” em comum – e o sentir-se “sendo”, já, a felicidade e o consolo de não “ser” sozinho.
Tudo aprendido, vivido, repartido, indivisivelmente múltiplo, em existências que, mesmo por poucos momentos, unem-se, tornando-se muito mais que uma, duas ou três, em uma síntese que supera a simples soma. Porque é na outra palavra que me encontro, na outra certeza que me firmo, no sorriso estampado à frente que me alegro, em indescritível comoção que transborda. Porque nos dentes que me sorriem está o sentido, e não sou mais sozinho nesta felicidade esgarçada de momento.
Nessa intensidade dói a simples ameaça da não-proximidade, a necessidade da distância: um futuro tão mais ameaçador quanto gradativo, concretizando-se em sutileza que anula qualquer tentativa de evitar. Distância diluída em diferentes interesses, divergentes ritmos e ocasiões distintas. E justamente por percebermos o que nos une assim, tão disperso, mal podemos acreditar que escapou o momento, quebrou-se o vínculo e ficamos novamente avulsos, sem aquela identificação fraternalmente humana.
Vemos as mudanças, todas com excesso de urgência, e perdemo-nos em tantos futuros sucedendo-se na velocidade que o tempo, acelerado, nos apresenta. Atemorizados, mal podemos identificar o que tende a se perder e o que é para sempre. Asfixiados pela ambição das conquistas, inebriados pelo novo, catamos tudo que é possível ao longo dos muitos caminhos e angustiadamente pedimos... agarrados ao que nos é precioso... consistência que preserve o que nos sustenta.
Que será do nosso próximo futuro?

terça-feira, abril 05, 2005

Uma leve quebra no ritmo faz-se sempre necessário. Revendo esta semana o filme Waking life, deparei-me com uma idéia interessante. Em certo momento um dos personagens menciona o fato de que talvez não seja possível viver a vida e compreende-la, ao mesmo tempo. Certamente um pensamento inusitado, mas que faz sentido: existem momentos intensos, em que entramos diretamente em contato com pessoas, acontecimentos, experiências, e outros em que damos uma pausa para organizar um pouco estas informações. Mais do que uma forma de entendimento, no entanto, tais instantes estão, eles próprios também, impregnados de vivacidade: um processo ativo em que reconstruímos a vida com nossa marca pessoal, revivemos, recriamos nossa realidade. No fim, terminamos por alcançar uma aproximação com esta nossa realidade subjetiva, individual, em um exercício de reencontro e auto-afirmação.
Talvez por essa necessidade de reconstrução introspectiva, tenho me aproximado também, com crescente interesse, da exploração das experiências oníricas pessoais, cada vez mais fascinado pelos limites do sonho e pela compreensão da fantasia como um estado de consciência tão relevante e, diriam os mais ousados, real quanto a nossa “vida desperta”.
Não sem o risco de soar como uma piadinha a respeito do ato de explorar estados alterados de consciência, penso que todos deveriam voltar-se um pouco mais para o que sua mente comunica através de sonhos, fantasias, ou, como afirmou Breton, pelo “pensamento ditado na ausência de qualquer controle exercido pela razão, fora de toda preocupação estética e moral” (em sua definição de Surrealismo).
Entregando-se às descobertas que nosso subconsciente nos reserva, desvendamos o implícito dos fatos, a “terceira cor do tabuleiro de damas”.Ou não: os dias têm-se mostrado repletos de subtextos, com fatos, momentos e sensações repletos de subjetividade, incerteza, nuances.

Para ouvir: Cocoon – Bjork


P.S. A propósito: comprei o dvd do filme do David Lynch, “Mulholland Drive”. Espero em breve revê-lo e voltar, aqui, a essa história toda de universos oníricos, fantasias, surrealidade.

sábado, abril 02, 2005

Fiction.
Non fiction.