terça-feira, novembro 30, 2004

Sem computador, por enquanto. Espero estar de volta em breve, assim que meu monitor voltar a si...

sábado, novembro 27, 2004

Há muito tempo, já, deveria ter falado aqui sobre uma preciosa aquisição com que me presenteei, no mês de setembro, após um bom tempo em que estive lendo versos soltos de Mário de Andrade, presentes em forma de citação, nos escritos de Fernando Sabino – este segundo, por sinal, muito contribuiu para estimular meu gosto pela poesia, ao mostrar-me por meio de suas citações o quão próxima ela poderia estar de nós, cotidianamente, e dissipar o restinho do odiável preconceito que reduz os poemas a meras reflexões amorosas carregadas de passionalidade e romantismo exacerbado.
Enfim... Tal aquisição trata-se do volume Poesias Completas, de Mário de Andrade. Comprei-o e estavam lá todos aqueles versos bonitos, estranhos ou curiosos com que me deparei no livro de Sabino e que despertaram meu interesse em conhecer melhor as poesias deste controvertido escritor. Confesso que fico um pouco perplexo com o teor de boa parte dos poemas, que considero um tanto “inacessíveis” ou, diria até mesmo, “ininteligíveis”, carregados que são de antigas expressões populares (é notável a pesquisa dos costumes populares e das tradições e a busca da brasilidade por Mário de Andrade), símbolos, metáforas, figuras de linguagem... Mas tranqüilo que sou com relação a essa questão do “entender racionalmente” e do “descobrir intimamente significados estéticos, idéias subjetivas e sensações, mesmo quando não se entende perfeitamente o que se lê”, não vejo grandes problemas nessa minha dificuldade e sigo, besta que sou, sem conseguir pegar o livro e não folheá-lo quase que por completo. Aliás, é assim que normalmente o leio: folheando, lendo poemas pela metade, emendando versos, fazendo “mosaicos poéticos”, como um leitor hiperativo.
Devidamente apresentada essa minha aquisição, digo que vou tentar postar uns poemas aqui de vez em quando, já que existem tão poucos poemas de Mário de Andrade na internet e alguns eu acho realmente bons.
O primeiro, então, é só um trecho, na verdade, do Rito do Irmão Pequeno, dedicado a Manuel Bandeira e muito citado por Sabino. Resolvi começar por esse pelo fato de que essa semana foi muito difícil para um bocado de gente, inclusive pra mim...


VI

Chora, irmão pequeno, chora,
Porque chegou o momento da dor.
A própria dor é uma felicidade...

Escuta as árvores fazendo a tempestade berrar.
Valoriza contigo bem estes instantes
Em que a dor, o sofrimento, feito vento
São conseqüências perfeitas
Das nossas razões verdes,
Da exatidão misteriosíssima do ser.

Chora, irmão pequeno, chora,
Cumpre a tua dor, exerce o rito da agonia.
Porque cumprir a dor é também cumprir o seu próprio destino
E chegar àquela coincidência vegetal
Em que as árvores fazem a tempestade berrar
Como elementos da criação, exatamente.

terça-feira, novembro 23, 2004

"Uma coisa é necessário ter: ou um espírito leve por natureza ou um espírito aliviado pela arte e pelo saber."
Friedrich Nietzche

domingo, novembro 21, 2004

Há algumas semanas atrás escrevi um post aqui falando sobre a saída de uma pessoa do meu atual-quase-ex-estágio no Tribunal de Justiça, estando eu motivado pelo fato de que, naquele período, coincidentemente saíram vários estagiários da nossa coordenadoria em um curto intervalo de tempo. Na ocasião, me ocorreu o pensamento de como todo aquele conjunto de ações já conhecidas e comuns a quem vai embora eram tão triviais, mas, ao mesmo tempo, poderiam significar algo para quem partia, uma vez que a minha própria reflexão a respeito daquelas saídas já eram carregadas de significado, mesmo a mim, que nem sequer estava vivendo aquela situação diretamente. Despedidas, abraços, desejos de sucesso e felicidade, promessas de contato e visitas algum dia, tudo poderia ser tão mecânico ou tão tocante, dependendo do grau de sensibilidade ou cinismo de quem aqueles instantes presenciava.
Eis que chega minha vez de dar adeus, e não poderia ser diferente: foi um adeus do meu jeito – apático, escondido, omitido – ou seja, o não-adeus. Eu não tive tempo, eu cheguei correndo, eu não sabia o que fazer: desvendar um jeito de fazer backup dos meus arquivos salvos no disco rígido ou me pôr a par das burocracias para rescisão do contrato? Informar a saída ao coordenador ou atualizar minha freqüência? O fato é que tanto tempo houvesse quanto fosse necessário, eu não saberia como fazer com que todos soubessem que eu ia sair. Eu não me imagino passando de porta em porta falando “ei, estou saindo, foi um prazer trabalhar com você...” Nessas horas que percebo o quanto meu comportamento anti-social pode ser incômodo: quando se entra e sai de uma sala de segunda a segunda, com uma feição simpática mas incapaz de dizer muitas palavras, e quando se gasta o tempo entrincheirado na mesa do computador pensando na vida ao invés de aproveitar os momentos de ócio (e esses existiram muito) para interagir e trocar conversas cordiais, passar de sala em sala e comunicar a saída só poderia soar estranho. Não se pode dizer adeus a uma intimidade que nunca existiu, criada de forma súbita pela pura necessidade de se despedir.
Ora, mas não se faz isso, não se despedir das pessoas! Então me alivia que ainda precise voltar ao estágio para resolver burocracias, pois o objetivo singular e o ineditismo da ocasião me ajudam a quebrar uma rotina de silêncio que eu mesmo, talvez por uma certa falta de jeito, criei.
Mas, enfim, voltando ainda àquela idéia de que hoje o compasso dos dias me leva à mesma situação na qual presenciei outros, meses antes, chego ao ponto que me intriga. Não percebi nenhuma grande comoção em quem se ausentava deste ambiente quando tal momento tornou-se premente, e no entanto confesso uma certa... inquietação (não encontrei outro nome). Deste modo, seria eu insensível em não perceber a comoção dos demais, seriam eles melhores do que eu em disfarçar esta “inquietação” ou sou mesmo mais emotivo e talvez mais fraco que os demais? Porque mal pude conter o nó na garganta, por exemplo, ao comunicar minha saída a um parceiro de trabalho que aprendi a admirar como profissional e, acima de tudo, como ser humano, embora mal tenhamos trocado experiências ao longo deste “um ano e oito meses” e as conversas tenham sido esparsas. Talvez seja mais “comovível” do que a maioria, e não constato isso sem um certo incômodo. Talvez ainda precise aprender a viver para aprender que uma pessoa não se deixa tocar assim tão facilmente por acontecimentos cotidianos, “da vida”, ou pelo simples fato de que em alguns momentos esta vida anda um pouco, digamos, mais depressa, por caminhos que ainda não desvendamos.
Neste lugar talvez tenha aprendido lições curiosas, que com o tempo compreenderei: é possível admirar alguém sem conhece-lo plenamente ou criar vínculos de amizade; é possível sentir-se bem sem se sentir produtivo de fato; é possível sentir-se bem visto mesmo quando se acha sub-aproveitado; é possível ter saudade e nostalgia mesmo quando se busca o novo.

terça-feira, novembro 16, 2004

Soube que ela tem chorado. Nem lembrava mais dela, no sentido mais amplo de lembrança como presença e sentimento, e tinha há muito tempo, já, passado a apenas saber da sua existência, sem comoção ou saudade, apenas na lembrança burocrática proveniente da memorização de fatos. E de repente descobri que ela tem chorado.

Ela que cresceu cedo, que queimou etapas, que teve, suponho, a ânsia de ser livre, de ser forte, de ser mais, amadureceu antes. Ela adulta quando eu, na mesma idade, desfiava sentimentos infantis... Ela imponente, aquela postura demasiadamente ereta, aquela simpatia petulante, aquela confiança... Ela que tragava quando eu ainda tomava meus chopps, que gostava quando eu ainda me escondia, que sorria sem medo ou vergonha quando eu ainda punha a mão nos lábios pra disfarçar... Ela tem chorado.

E disse que “de certa forma” é feliz. Estranho. E eu queria dizer que não a imagino dizendo isso. Ela sempre foi alegre, naquela qualidade de alegria desavergonhada e intensa. Queria então dizer que não a imagino dizendo que é feliz “de certa forma”, e é verdade que, quando soube, a princípio não imaginei. Só que ela com filho, ela casada, ela morando longe, ela confinada, trabalhando e sendo mulher de família, ela senhora, deve ter inventado mais essa, e de tanto que cresceu passou a falar coisas que não se imagina.

O fato é que, pensando melhor, aderindo àquela reflexão que acompanha os pensamentos diários sem tomar a dianteira mas que surte seus efeitos, entendi depois de um tempo o que deve ser este “ser feliz de certa forma”. Mas tal entendimento é mais uma suspeita - porque não sou maduro, não sou imponente, não conheço a satisfação pelo que tem que ser ou a resignação pelo que aconteceu, simplesmente. Conheço aquela alegria incisiva, súbita, que faz rir por dentro e traz euforia. A felicidade, esse sentimento que por natureza é mais duradouro e conceitualmente suponho que deva ser mais linear, não conheço bem. Muito menos “de certa forma”. E nem posso afirmar saber de muitos que o desvendem. À parte essa deficiência, no entanto, desejo-lhe a felicidade, sinceramente. Desejo-lhe que seja feliz, de muitas formas.

Para ouvir: Nancy Wilson – Elevator beat

sexta-feira, novembro 12, 2004

Clarice Vogler

Ruas do Recife Antigo. Noite. Artistas declamando textos enquanto compro vinho. Uma linda e jovem atriz lisonjeada com alguns elogios.
Uma mulher misteriosa, de aproximadamente trinta anos, que se disfarça e marca encontros com uma jovem, ensaiando gestos, repetindo falas combinadas, subtextos intencionais. Para quê? Não se sabe...
Tudo uma peça de rua, acontecendo em esquinas e prédios do bairro boêmio. Apenas eu assisto. Três atores (sendo um deles a bela jovem) mais a mulher misteriosa que só aparece no final.
Em uma cena, trancam-se em uma sala; apenas ouço as conversas por trás da porta branca, até que observo pelo olho mágico. Cacoetes e expressões distorcidas pela pequena estrutura de vidro, repetindo-se indefinidas vezes.
(Assistir a uma peça encenada só para você, por meio de um olho mágico? Só sei que foi assim...)
Uma trama circular, um nó na história, uma esfera se desprende e atravessa o corredor, dando início à cena do encontro: a jovem e Clarice Vogler, juntas. Falas ensaiadas (pelos personagens, não pelos atores), desentendimento – não está sendo feito da forma correta, reclama a mulher madura. Ponto circular da trama, tudo se reinicia naturalmente, a peça inteira mais uma vez, e minhas ações também. A compra do vinho; os elogios; a beleza da jovem atriz; Clarice Vogler – quem é ela? No meio de tudo isso, um desfile por uma ponte, ao som de uma música grotesca que não sai dos ouvidos, cantada de forma meio infantil, meio demente.
Círculos...

Isto não foi sonho, foi experiência fora do corpo. :P E ainda acordo esquecido de onde estou...

terça-feira, novembro 09, 2004

Pensamentos clichês seriam, de fato, clichês, se não fossem estes não apenas comuns mas também relevantes a tantas pessoas, em tantas ocasiões? Talvez por isso mesmo sejam clichês e transformem-se nesse tipo de lugar-comum: todos os têm em alguns momentos da vida, guardam-nos para si e os conhecem bem, tamanha a clareza com que se mostram, verdadeiramente dignos de atenção.
É com tal condescendência para com esta qualidade de reflexão já tão exaustivamente expressa e remoída que menciono, ao menos de modo breve, então, a surpresa que me assola ao revisitar pequenas lembranças de circunstâncias passadas e me deparar com a obviedade, ou melhor, com a primitiva e simplória clareza dos fatos. O distanciamento que permite enxergar de forma tão estupidamente explícita a configuração e o desenrolar de determinadas situações põe abaixo qualquer impressão equivocada de uma suposta “complexidade”.
Refiro-me aqui ao mais clichê de todos os assuntos: as fotografias antigas. Para simplificar, então, digo simplesmente: convém preservar as velhas fotos, pois elas guardam em si a verdade, e qualquer apreciação distanciada e desprovida da influência da memória recente pode mostrar claras e relevantes descobertas.
Faz-se oportuno, assim, questionar: serão tão claras também as circunstâncias presentes, sendo estas tornadas obscuras apenas por uma imperdoável miopia própria do tempo presente, do calor das emoções?
Observar, de vez em quando, os fatos presentes como fotografias antigas: eis um saudável exercício de distanciamento que pode, em último caso, ajudar no encontro da real dimensão do que nos aflige.

quarta-feira, novembro 03, 2004

Nesses próximos dias, a cidade respira cultura...

- II Semana Nacional de Cultura e Reforma Agrária do MST, na UFPE
- VIII Encontro Socine (Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema), na UNICAP
- Festival Varilux de Cinema Francês, na FUNDAJ

Infelizmente, vou acabar não participando de nada disso, estou totalmente sem tempo, cheio de tarefas sem sentido mas obrigatórias a realizar.
Ah, como eu queria ser muitos e ter muito tempo para participar de tudo isso... Lembrei agora de um verso do Mário de Andrade, “sou trezentos, sou trezentos e cincoenta”. Eu também queria ser muitos, ou então ao menos saber o que priorizar, descobrir o que me interessa de verdade, pra não ficar querendo fazer um pouquinho de cada coisa, querendo um pouco de tudo. Quero deixar de ser “trezentos, trezentos e cincoenta” apenas nos meus interesses frustrados e passar a ser múltiplo também nas minhas ações...
Mas cá pra nós, que cidadezinha abençoada, essa, berço de tantos acontecimentos que produzem, divulgam e pensam cultura. Por isso Recife me conquista um pouco mais a cada dia.
Se chegarem a ler isso aqui, sintam-se repreendidos... :P Gastem no computador apenas o tempo necessário para pegar a programação desses eventos (vou nem comentar alguns dos muitos pontos destas programações que me chamaram a atenção, pra não ter raiva...), vão em frente e participem de tudo que puderem. Só não me contem nada depois, porque sexta-feira já estarei na estrada, de novo...

terça-feira, novembro 02, 2004

Engraçado descobrir uma música como se a ouvíssemos pela primeira vez.
Curioso também como palavras felizes, de conforto, podem soar de forma tão distinta quando inseridas em diferentes contextos, seja da vida de quem as escreveu e cantou, seja daquele que as ouve...

“Viver é bom
Nas curvas da estrada
Solidão, que nada
Viver é bom
Partida e chegada
Solidão, que nada”

Definitivamente, viver nas curvas da estrada é de uma incerteza boa, quando até o ruim tem sua razão de existir...