segunda-feira, maio 19, 2008

o tempo deliqüescente

"À tarde, íamos ver os peixes do Quai de La Mégisserie, em março, o mês leopardo, ainda frio, mas já com um sol amarelo onde o vermelho entrava um pouco mais cada dia que passava. Da grade que dava para o rio, indiferentes aos bouquinistes que nada nos dariam sem dinheiro, esperávamos o momento em que veríamos os aquários (andávamos devagar, adiando o encontro), todos os aquários ao sol e, como suspensos no ar, centenas de peixes cor-de-rosa e negros, pássaros quietos em seu ar redondo. Éramos tomados por uma alegria absurda e você, Maga, cantava com vigor, arrastando-me para atravessar uma rua, para entrar no mundo dos peixes pendurados no ar.

Os aquários, grandes e pequenos, redondos e cúbicos, eram colocados na rua para atrair os curiosos. Entre os turistas e as crianças ansiosas, sem falar das senhoras que colecionavam variedades exóticas (550 fr. pièce), encontravam-se esses aquários, ao sol, verdadeiros cubos ou esferas de água que o sol misturava com o ar, e os pássaros cor-de-rosa e negros, girando e dançando docemente numa pequena porção de ar, lentos pássaros frios.

(...) E nós pensávamos nessa coisa incrível que havíamos lido, que um peixe sozinho no seu aquário se entristece e, então, basta colocar um espelho em frente do vidro e o peixe volta a ficar contente..."

O jogo da amarelinha, Julio Cortázar

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