segunda-feira, agosto 02, 2004

Depois do meio-dia

Sujeira. Não aquela que se limpa fácil, mas a orgânica, mesmo, que cheira mal, apodrece...
Discussão na porta ao lado. Não um conflito melancólico, trágico, dolorido, mas aquela briga repleta de vulgaridade, saliva, brados alucinados, futilidades jogadas na cara com palavras feias e sentimentos “baixos”(?).
Palavras religiosas na parada de ônibus. Não uma simples pregação de fé, vontade boa de compartilhar a alegria de espírito, mas ameaça de inferno, sentenças carregadas de julgamento, veemência da alienação, voz alta que machuca os ouvidos com o exagero do exibicionismo xiita.
Almoço improvisado, rua da guia, sol quente...
Antes de tudo - da sujeira, da briga, do fundamentalismo, do lanche barato – a poesia de Drummond. Depois de tudo, soam ainda mais forte, na mente, os versos, as palavras...

“(...)
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.”

Trecho de “Os ombros suportam o mundo”, Carlos Drummond de Andrade


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