quinta-feira, junho 24, 2004

Se, para mim, existe uma musa no meio musical, esta musa é Cerys Matthews. A ex-vocalista do Catatonia exerce o que se pode chamar de uma “atração peculiar”. Já havia lido sobre a banda em meados de 2001, acho, quando então vi na MTV (na época em que ainda havia algo que prestasse na emissora) o clip da música International Velvet, cujas estrofes cantadas em galês, idioma tradicional do País de Gales, local de origem da banda, conduziam a um refrão que explodia em alto e bom som: “Everyday when I wake up I thank the Lord I’m welsh”. Cerys, de salto alto, vestido rosa brilhoso, com sua boca grande e sua voz melosa, suas curvas volumosas, seus cabelos levemente desgrenhados e seu rebolado ébrio, era a mulher mais libidinosa da música pop. Ponto.
A paixão foi imediata. Não existia, no entanto, um só CD do Catatonia lançado no Brasil. Acostumado, no entanto, ao dilema de gostar de bandas e músicas menos, digamos, acessíveis, e motivado pela curiosidade de conhecer aquela banda popular e de qualidade, além de, claro, estar certo de contar com a grande ajuda do finado Audiogalaxy (que Deus o tenha, quanta falta nos faz... :P), lancei-me à Internet e, várias semanas depois e muitas horas de sono a menos (conexão discada é uma molecagem!!), tinha 74 mp3 da banda: todos os quatro álbuns de carreira e montes de B-sides.
A constatação foi imediata: a banda era mais controversa do que se poderia supor. Cada música de um álbum seguia um estilo, eram completamente diferentes entre si. A comparação com o Pato Fu, outra banda de pop bem-humorado, de músicas sempre distintas, algumas de certo modo experimentais e por vezes grotescas, foi inevitável. Os B-sides, então, eram estranhíssimos. Gostei de tudo, claro, mesmo reconhecendo que meu gosto poderia ser mais duvidoso do que se poderia supor.
Cerys já foi chamada de tudo. De “bêbada gente fina” a “Barbie da música pop”, passando até por um concurso que a elegeu a mulher mais mal-vestida do Reino Unido (não me perguntem a relevância disso, deve ser coisa de crítico de moda...). Sua voz é um caso a parte: melosa, quase infantil, mas mudando às vezes de tom, soando mais áspera, ou simplesmente sussurrada. Em alguns momentos, lembra uma Björk vocalmente mais inventiva; em outros, beira a desafinação, de tão afetada... Vale mencionar, ainda, o sotaque...
Cerys não é necessariamente bonita (em fotos mais recentes, do período de gravação de seu CD solo, Cockahoop, está feia de doer, na verdade), mas seu jeito de cantar e sua sensualidade levemente vulgar chamam a atenção...
As composições do Catatonia, então, podem fazer rir e melhorar o humor de qualquer um, mas também podem ferir com a sutileza das ironias ou a melancolia de alguns momentos introspectivos desses galeses. Tão distintas, as letras vão desde banalidades como o pop tosco e radiofônico Mulder and Scully (“I’d rather be jumping shit, I find myself jumping straight in… Things are getting strange I’m starting to worry, this could be a case for Mulder and Scully…”) a pérolas como a melancólica e introspectiva Whale (“It's hard to reflect when your world is sighing, You could never catch it, and there's no use trying, I blew it…”). Nomes estranhos, aliás, não faltam às composições: I am the mob, Part of the furniture, Strange glue, Goldfish and Paracetamol, Bulimic beats… O que predomina, sempre, é a originalidade… E um certo nonsense, é preciso confessar. Entender letras como “The ad begs ‘Buy bottled water’ but we know that it tastes of piss, Should be getting our tampons free, DIY gynaecology” (da música She’s a millionaire) pode mesmo ser um problema. O bom humor, no entanto, é quase onipresente. Algumas são hilárias, como a suposta preocupação de Cerys com seu relógio biológico e a maternidade, em You’ve got a lot to answer for (“You said I got the looks, well I got the means, Let's get together mix each others genes, Can't buy myself a future, my DNA'll be past it's sell by date”).
Se há, no entanto, alguma dúvida sobre a seriedade da banda, basta ouvir músicas como Dimbran, cantada toda em galês e simplesmente fantástica!
Infelizmente, o que é bom dura pouco: o grupo Catatonia acabou ainda em 2001, depois que Cerys, insatisfeita com a banda e fragilizada pelo excesso de álcool, buscou uma clínica para se recuperar de suas famosas bebedeiras. Surgiu em 2003 com um álbum solo, de estilo alternative folk, gravado na América. Não deu muito certo, pois faltou a espontaneidade e a graça da antiga banda. A música Caught in the middle, no entanto, remete aos bons momentos de Gales.
Para atestar o sucesso da banda, cito apenas que o hit Road rage foi escolhido como a melhor música de 1998 por boa parte dos críticos do Reino Unido e o álbum International Velvet, desse mesmo ano, está hoje em várias listas de melhores da década. No mais, danem-se os intelectualóides. Catatonia pode até ser uma droga, o que não concordo, mas vicia! E dá o maior barato...

Para ouvir:

Dimbran – Catatonia
Don´t need the sunshine – Catatonia
Game on – Catatonia
Infantile – Catatonia
Londinium – Catatonia
Whale – Catatonia
Some half baked ideal called wonderful – Catatonia

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