quarta-feira, agosto 12, 2009

espera

A utopia que alimenta uma cabeça atormentada pelo tempo sem graça dos intervalos é ter o seu campo de foco reduzido ao imediato. É a retidão e o imediatismo absolutos que subsistem em uma sucessão de gestos mínimos e pragmáticos: beber chá, ler capítulo, enviar arquivo, comer ou beber isso.

A ambição maior é ocupar aquele lugar dos seres supostamente primitivos – quando caricaturizados por quem os representa – e aderir à sua fala inábil: mim fábio. Porque nem bem se começa a articular mais do que três palavras e já se começa a querer demais, e com esse querer vem todo o resto que ninguém sabe dizer o que é, porque é sempre diferente de tudo o que acontece.

Assim, que me interpele algo inesperado que eu não consiga compreender agora – é o que pede a cabeça suspensa –, e que os seus efeitos se prolonguem espalhando uma fina excitação que dê conta da articulação das minhas palavras. Porque estas, quando carentes de qualquer destinatário, começam a desdobrar-se em linhas fantasiosas (que são puro capricho), até se perderem no hábito de inventar, que nesse caso não é mais do que a confirmação de sua irrelevância.

Que surja, assim, algo misterioso o suficiente como para sugerir um outro nível de percepção – há pouco lembrado e novamente esquecido –, enquanto as pessoas vão sumindo juntas na mesma série desinteressada por onde passam, iguais em falta de importância e aleatoriedade, o chá, o livro, o doce, a cerveja, os pratos, o lixo, o sono, as horas.

Um comentário:

Mari disse...

as horas...
e elas passam