Somos interpelados de muitas formas. Até nas mais pequenas coisas somos levados a nos expressar, a dizer o que pensamos e somos, mesmo quando não temos clara idéia do que possamos ser ou devemos pensar, de fato. Vivemos em mundos múltiplos e desconexos e respondemos por ações e palavras que não se completam, mas tentamos juntar estes pedaços de vida e sentido e atribuir-lhes o nosso nome. Buscamos saber - e dizer - o que somos, e não raramente nos surge a dúvida se podemos de fato ser nomeados de modo singular, monolítico.
Vivemos de forma fragmentada, vendo tudo a partir de molduras, recortes e enquadramentos que nem sempre se encaixam. Em um mundo de tantas formas esquizofrênico, dedicamos nossa emoção e afeto a algumas coisas, defendemos com convicção política (ou com uma certa falta dela) outras, elaboramos racionalmente nossos pensamentos de uma terceira forma, e as ações, essas simplesmente não obedecem muito ao imaterial mundo das idéias e sonhos. Perdidos no meio dessa bagunça tentamos saber quem somos, no que acreditamos de fato e, sobretudo, no que vale a pena acreditar, com a esperança de descobrirmos a forma certa de viver, mesmo sabendo racionalmente que a forma certa parece não existir de fato.
Persistimos nesse esforço para que um grande número de contradições, conflitos, vontades e convicções se encaixem e então possamos dizer: - “Está aqui: este sou eu! É este universo delimitado que responde pelo meu nome”. Porém, como eu é uma fantasia, uma ficção, sempre há algo que sobra, não se encaixa na fórmula, e quase sempre isso que sobra é a parte obscura ou incerta que não queremos que entre no inventário de nossas particularidades. Mas digo quase sempre porque, às vezes, o eu se rebela - anarquia do querer e do saber ser - e viramos um monte de partes desconexas sem qualquer hierarquia: não sabemos mais o que prevalece, o que pôr em primeiro plano e o que descartar ou esconder.
Sou muitas pessoas que não dialogam entre si, não se entendem e sequer conhecem a frágil ordem de uma fila indiana.
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