Eu tava aqui olhando umas besteiras e comecei a seguir links até que me encontrei assistindo a uns vídeos bem antigos como os que eu via sempre nas minhas madrugadas, logo que cheguei a Recife, lá pelo começo do ano 2000. Eu geralmente ficava acordado até bem tarde e, dentre outras coisas, assistia ao Clássicos MTV, programa que adorava. Ficava com o videocassete a postos - sim, nessa época eu ainda tinha esse hábito jurássico de gravar fitas inteiras com coisas de televisão - até capturar alguma preciosidade que seria exaustivamente revista.
Desde adolescente eu sempre tive um fascínio especial e inexplicado pela música e pela cultura sessentista, de modo tal que conseguir aquela sonhada gravação de Janis cantando Piece of my heart foi um dos momentos de glória desta minha curta carreira de colecionador de imagens. No entanto, mais do que pela coisa toda da contracultura que também sempre me interessou, o que era mais forte no meu apreço pelos vídeos dessa época era a questão da imagem registrada em uma época tão antiga quanto a televisão em preto e branco.
Engraçado porque, neste sentido, o que importava não era tanto o período em si, mas o fato de que para mim, tão novo como era na época, imerso no presente imediato em uma intensidade que só os adolescentes podem atingir, os anos sessenta eram talvez o mais longe no tempo que eu conseguia voltar. O maior fascínio então - e o que eu lembro agora - era por aquele registro de um passado, era pensar nos mortos que se faziam presentes naquelas imagens, era a descoberta (tardia) de que aquilo que a imagem ali re-apresentava era já algo sem vida, algo que foi e que não mais existe.
Assim, no que diz respeito especificamente aos vídeos, marcaram-me menos as grandes apresentações de rock que as gravações antigas de programas e apresentações onde artistas da Motown se apresentavam com aquelas roupas, cabelos e trejeitos. As melodias fáceis soavam a nostalgia e carregavam o peso do cliché pelo recurso de usá-las em qualquer circustância em que se pretendia aludir a uma outra época, talvez mais áurea, mais romântica do que a atualidade.
Ver o público dançando, sua forma de gritar para os ídolos, o olhar de paixão que estes lançavam juntamente com a melodia que entoavam, tudo isso atribui um ar fantasmagórico ao todo, amplificado por uma atmosfera meio esfumaçada e uma impressão estranha de que aquilo parece nunca ter sido presente, fato vivo. Como se as imagens já nascessem antigas - datadas, para retomar a palavra de um amigo, quando comentando e compartilhando dessa minha impressão - , como se aqueles seres nunca houvessem sido de carne e osso, mas só existissem na tela como sonho, como simulacro, desconectados da realidade com a qual não teriam nenhuma vinculação; sua presença não relembrando histórias, existências, mas compondo uma dimensão imaginária que nunca existiu em cores nem fora da bidimensionalidade do registro, dos limites do quadro.
Enfim, não parecem irreais, estes corpos se movendo de forma tão sinuosa, em uma velocidade que não é a mesma do mundo vivo, e a voz saindo não das bocas das cantoras mas da própria imagem, reforçando a impressão de que tudo está na superfície da imagem e não na materialidade do espaço que ela registra?
(Este cárater simulacral a cantora Amy Winehouse bem soube recuperar, exagerando, para a composição de sua persona, como bem atesta aquela ficção que é o cabelo dela).
Sensação semelhante a esta que descrevi talvez possa ser evocada com relação às imagens em super 8, estas de fato já estando praticamente vinculadas a uma idéia de passado, lembrança. Assim também se pode falar de alguns filmes antigos onde movimentos, roupas e expressões parecem irreais - filmes mudos e da nouvelle vague, principalmente, e ainda outros como por exemplo Mouchette, de Robert Bresson e O martírio de Joana D'arc, de Carl Theodor Dreyer. Na verdade, acho que a lista de imagens fantasmagóricas poderia seguir ad infinitum.
p.s. Uma rápida pesquisa sobre a idéia de fantasmagoria relacionada à imagem, na internet, mostrou que existe um livro do Erick Felinto bem específico sobre o assunto, chamado "A imagem espectral: comunicação, cinema e fantasmagoria tecnológica" (!). Fiquei curioso para conhecer o modo como ele desenvolve a idéia. Como não o li, obviamente não posso dizer se tem alguma coisa a ver com o que pensei aqui ou se eu só viajei mesmo. :p De qualquer forma, fica registrada a existência do livro. Se eu conseguir lê-lo, depois conto.
sábado, agosto 23, 2008
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Um comentário:
My love,
no quadro tudo se torna mais doce e perfeito!
liga pra mim e diz que me ama! uiui
xero e eu digo que prefiro nosso classicos viu?
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