Pulou no tempo, no vazio das horas. Corpo flexionado se contorce, suspenso, curvo, tensionado, para espalhar o ar numa brisa imperceptível. É dos membros agitados a fração daquele segundo, a perfeição daquela queda, antes que a água o engula, salgada, mole, embrulhando-se em movimentos ondulados. Pernas agitadas não tateiam o fundo, enquanto na boca resta o convite petulante: a hora, agora... Pula!
Na quietude, senta-te ao longe, nem precisa ir, é completa aqui a nossa alegria. Os barcos passam – ou será só lembrança mal-contada, fantasia de um píer? –, o horizonte vai longe, assim, do alto onde estamos, onde a cerveja é gelada e a nicotina embebeda olhos marejados. Houvesse uma câmera e dali sairia uma fotografia, mas o que sai é lembrança – e a gente vive tanto que esquece de guardar. Porque alegria, ali, não se escreve com luz - se escreve na retina de quem vê, calado... Sorriso nem chega ao rosto: dissolve-se em algum lugar lá dentro, na música que toca sem fim, única, repetida, numa atmosfera apenas de quem escuta atrás dos olhos, perto da boca que não canta, parada, e numa melancolia feliz de momento desejado, daqueles que a gente dá a vida para ter e nem percebe.
Vê a brincadeira! Naquele momento é apenas a água, e é tão feliz que ninguém mais precisa participar... Deixa os meninos brincarem, fedendo a peixe, gotejando sal, aproveitando a água um pouco suja – que seja! Deixa tudo se repetir, incessantemente: a mesma escalada para um novo salto, o alarido, a água espalhada e ressentida da brincadeira, revidando o insulto com uma força impensada que os puxa para baixo, sem sucesso. Conserva tudo ali, distante, porque a gente só precisa ver, agora, entendendo que nosso entusiasmo também cresce assim: nós todos imóveis, próximos, sorvendo o frescor gelado de uma bebida enquanto as conversas ficam em silêncio. Assim também é que podemos permanecer crianças, aspirando à beleza das águas e cristalizando este momento.
Ele pulou mais uma vez. E o outro, agora. E outro que os segue, apressado. Mas para cada um de nós não precisa mais nada, nem sequer descer até lá...
...Que o nosso pulo nos enverga, também, e ficamos suspensos, assim, à medida que se aproxima a inevitável queda.
quarta-feira, março 02, 2005
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